*por Pe. Luciano Guedes da Silva
Pároco de Cuité.
Para os romanos, sinal de tortura e castigo, para os judeus um escândalo e vergonha, para os gregos, uma loucura! Para a Igreja de Jesus, afirmação da eternidade, vida que se vislumbra para além das misérias e imperfeições humanas, força que destrói o mal. Assim, a cruz, na história desponta como sinal, para todos inquietante, da realidade misteriosa e transcendental que envolve a humanidade.
A chamada “Semana Santa” em nossa tradição católica recorda exatamente esse fundamento de nossa esperança cristã. Isso porque atualiza em nosso contexto de fé, os episódios históricos que narram a entrada de Jesus Cristo em Jerusalém, aclamado como Messias e Salvador (domingo de Ramos e da Paixão), despedida e Ceia com os discípulos (quinta-feira), Crucifixão e Morte (sexta-feira) e a Ressurreição, no primeiro dia da semana (domingo de páscoa).
Sendo assim, tudo o que mais celebramos em qualquer parte e circunstância do tempo, fará referência a isto: a Páscoa redentora de Cristo. Podemos assim compreender que a Igreja nasce desta fonte, fruto da “fé pascal” comunicada pelas testemunhas e discípulos do Senhor Ressuscitado.
A fé cristã, basicamente, é a interpretação deste sentido novo e pleno para o homem. E neste ponto, devemos hoje nos perguntar também: a religião tem sido para nós, uma busca de sentido para a existência ou somente uma forma interessada de solucionar problemas e desconfortos do dia-a-dia, próprios da caminhada humana?
Aqui é que importa para nós, cristãos, a compreensão da cruz redentora de Cristo. Ele, Jesus, muitas vezes falou aos discípulos da necessidade da cruz: “Quem quiser me seguir, tome sua cruz e siga-me”. Hoje vemos surgir uma religião, inimiga da cruz, seduzida pela prosperidade e pela abundância das conquistas, anestesiante da dor e dos limites da pessoa, entorpecente das consciências, numa ilusão de que não precisamos nada sofrer. Uma redução do homem ao horizonte puramente material da vida, uma porta aberta e larga para outra vez trair nosso Senhor, e longe dele ficar.
Como cristãos, acredito, que em tempos de mercado religioso tão farto e enganoso, precisamos retornar ao “testemunho da cruz”. Ela é nossa vitória, sim, nossa vitória porque nos indica que os limites humanos nunca cessarão, aliás, estes mesmos limites que nos causam incômodos, são a prova cabal da nossa finitude, da nossa necessidade de alcançar o Verdadeiro, o Belo, o Perfeito, o Eterno.
Ao assumir a cruz, nossa fé não é masoquista, não! Ela é fé, encarnada na história concreta, que não divaga nas fantasias e modismos, ou na tentativa de propor ao homem um caminho fácil, porém, mentiroso. Cristianismo sem cruz é ilusionismo e magia. É produção humana e interessada para distrair o público, para dele talvez aproveitar-se também.
Vencendo a cruz, o Cristo oferece a humanidade uma significação absoluta para o sofrimento e para o mal que é causado pelo pecado dos homens. O perdão aos inimigos é também parte desta novidade, realidade tão difícil de ser compreendida pela nossa lógica justiceira e racional.
Eu desejo a você que não fuja de sua cruz. Ela certamente é “recado divino” do céu, de Deus, para lhe comunicar algo muito maior do que aquilo que hoje você pode hoje enxergar e compreender. Amar a cruz nos dá condições de entrar no mistério do grande amor de Deus, que nos salvou por este sinal tão contraditório, mas tão grandioso!
Nossa glória é a cruz, pois ela ensina-nos que todo amor verdadeiro experimenta o esvaziamento de si próprio e a renúncia, como condições para amar com mais qualidade. Lembrando sempre que o importante não é ficar “presos” à cruz, mas abraçá-la, com o propósito de transpô-la, de torná-la mediação para a realidade nova e feliz que nós esperamos confiantes no Senhor.
Que a sua semana santa seja a porta de uma verdadeira redenção. Desejemos todos aperfeiçoar nossa qualidade como pessoa, mais capacitados para amar, para perdoar, para servir - eis o grande desafio de nossa evolução humana em Deus. Queiramos ser homens novos, porque Deus em Jesus Cristo, nosso Senhor, já nos salvou por sua cruz libertadora!
Feliz páscoa para você!
0 Comentários